Mafalda
é um personagem de quadrinhos que fez muito sucesso a partir do Clarín, nas
décadas de 1960 e 70, talvez porque combinava humor, cinismo e esperança de um
jeito que desarmava até as almas mais arredias. No time de personagens que
gravitava ao redor da Mafalda, tinha o Manolito, umfilho de comerciantes que
enxergava o mundo a partir de relações de compra e venda. Seus descendentes atuais
são aqueles que não querem aprender, mas “agregar valor”.
O
sucesso destes personagens está em que sendo irreais, estão em todos lugares. Nesta quarta-feira, Flavio Rocha, presidente de uma grande
cadeia de lojas, publicou na Folha de São Paulo sua visão de como as recentes manifestações foram
criadas a partir de um processo educativo de consumidores, que de reclamar
quando a geladeira nova quebra, passaram a exigir melhores serviços públicos.
Não
posso falar por eles, mas por mim, digo que não sou consumidor, porque consumir
não é a coisa mais importante que faço. Assim como todos precisamos consumir,
também assoamos o nariz e defecamos, mas isto não autoriza a ninguém chamar-me
de “assoador de nariz”.
Consumir
é gastar, queimar, esgotar. Evito todos diligentemente. Prefiro restaurar (eis
aí minha porção Manolito, divulgando o Ecologia da Restauração, à venda nas
melhores casas do ramo...), e também inventar, criar, conceber e aprimorar.
Felizmente
há Mafaldas também no mundo para lembrar que podemos fazer mais do que trocar
nossas vidas por dinheiro, e dinheiro por bugigangas que rapidamente viram lixo
e causam morte de variadas formas.
A
Mafalda de nossos dias se chama Anne
Leonard e tem uma platéia um tanto maior que nossa histórica e pequena heroína familiar.
Em seu vídeo “história das coisas” na tradução do original do inglês, ela conta
como é possível que algumas coisas custem tão barato e o que existe de
exploração de seres humanos desde a produção até a disposição final destes
materiais.
Cidadão não é consumidor, e o consumo não é a “porta de entrada da cidadania”. Ao
contrário, o consumo é a porta de entrada de um neo-escravagismo, talvez ainda
pior que o primeiro, por aprisionar corações e mentes.
Sensacional.
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